Publicado por Redação em Gestão do RH - 06/10/2020 às 15:59:24

Como manter a cultura organizacional no "novo normal"?



No começo, parecia maravilhoso: trabalhar de casa significava não perder tempo no trânsito, economizar nos gastos com roupas, combustível, restaurantes, e, de quebra, mais tempo em família. Aos poucos, porém, os desafios do home office começaram a se impor: como manter viva a cultura organizacional em um momento em que as pessoas trabalham longe umas das outras?

A pergunta não é irrelevante. Pelo contrário. Cada vez mais os especialistas em gestão reconhecem a importância dos valores e da cultura de uma empresa para o sucesso de longo prazo de uma organização. Até agora, toda a história corporativa foi construída com base nas relações presenciais entre colaboradores. É certo que o outsourcing foi um primeiro impulso em direção às relações à distância. Mas, até o isolamento forçado nessa quarentena, nunca tivemos que trabalhar tanto tempo longe de nossas equipes.

O que é cultura empresarial?

Antes de avançarmos, é bom deixar claro o que se entende por “cultura empresarial”. Podemos fazer isso separando-a do clima de uma empresa.

Cultura é a personalidade da organização, são os seus valores. Não é algo que se cria e se consolida da noite para o dia. Pelo contrário, leva tempo. Uma cultura é construída quando os valores de uma empresa são estabelecidos, testados e aplicados em diversas situações – e esse processo é reconhecido e adotado pelos colaboradores.

Já o clima pode ser entendido como o humor da empresa. E humor varia conforme o momento. Uma “festa da firma” de arromba, bons resultados financeiros e um bônus generoso jogam o clima da empresa para o alto em um curto espaço de tempo. Mas, da mesma forma que um dia acordamos felizes e no dia seguinte estamos tristes, o clima da empresa muda rapidamente se a festa for um fiasco, os resultados anuais forem abaixo do esperado e se os líderes não tiverem acompanhado e desenvolvido suas equipes durante este período.

O importante é que uma empresa com cultura sólida pode sobreviver a períodos de clima ruim – e, no sentido oposto, não há boas notícias que mantenham o otimismo em uma empresa que não tenha cultura bem estabelecida.

Colaboração à distância é possível?

Cientistas que estudam a evolução do homo sapiens dizem que não foi simplesmente o tamanho do nosso cérebro e a nossa inteligência que nos colocou no topo da cadeia alimentar. Se volume cerebral fosse o mais relevante, uma baleia dominaria o mundo – e o homem de neandertal, que tinha cérebro maior que o nosso, não teria sido extinto.

Dominamos o mundo graças à nossa capacidade de colaborar e trabalhar em equipe. Em “A Evolução Improvável”, o psicólogo William von Hippel mostra como a nossa capacidade evoluiu para permitir que as pessoas confiassem umas nas outras e, dessa forma, se juntassem para caçar um mamute, plantar e criar cidades. Outro acadêmico, o historiador Yuval Harari, diz que é a crença em valores abstratos que une as pessoas em torno de objetivos. Pessoas se unem em torno de diversos valores ou entes abstratos: uma bandeira, um time de futebol, uma moeda e, no caso de uma empresa, em torno do seu propósito e valores, que estão expressos em sua cultura.

Seguindo esse raciocínio, o desafio dos executivos está dado: como construir e manter uma cultura organizacional que promova a colaboração dos funcionários em objetivos comuns em um momento em que estamos longe uns dos outros? É certo que não evoluímos para colaborar em videoconferências ou aplicativos de bate-papo. Então, como superar esse desafio?

Como fazer?

Aqui é forçoso dizer algo que deveria soar como óbvio: não existe fórmula de sucesso. O que vale para uma empresa pode não valer para outra. Se uma empresa visa mais os resultados financeiros, não crescerá alicerçada nos mesmos valores de uma empresa que tem como diferencial a inovação.

Eu diria que a manutenção dos valores e, em última instância, da cultura de uma empresa em tempos de isolamento social, depende da proximidade dos líderes com suas equipes. Não se trata de uma escolha. Um momento como esse exige isso e quatro atributos permitem a prática desse mandamento:

1- Empatia: escutar a equipe é fundamental. Um líder que não escuta não está exercendo sua liderança. Estar aberto para acolher os medos, dúvidas e inseguranças dos colaboradores é papel do líder, principalmente em tempos de crise;

2- Disciplina: a proximidade com os colaboradores depende de uma rotina de reuniões, em grupo ou individuais, pelo menos uma vez por semana. Os desafios de gestão podem provocar a tentação de remarcar esses encontros. Precisamos resistir e manter a agenda previamente definida;

3- Objetividade: a impossibilidade do contato próximo torna ainda mais relevante uma comunicação simples, direta e efetiva. Principalmente quando se trata de comunicação escrita. O risco de falhas na interpretação é grande e a clareza para evitar ambiguidades é imperativo;

4- Respeito: respeitar a individualidade de cada membro da equipe e, principalmente, suas particularidades familiares e horários, sem que isso prejudique as entregas e os resultados de negócio.

Como será o novo normal?

A minha experiência profissional e o contexto em que vivi minha vida me levam a afirmar: para boa parte das empresas, um home office total significará a morte lenta da cultura empresarial. Uma coisa é uma equipe, já entrosada e habituada a trabalhar junto, se ver forçada a mudar para o ambiente digital. Outra, completamente diferente, pode ocorrer no futuro com a manutenção do home office: relações fluidas e não baseadas no companheirismo e confiança. Como será a relação entre os membros de uma equipe que nunca sentaram em uma mesma mesa para participar de uma reunião, para tomar um café, almoçar ou confraternizar em um happy hour?

Situações como essas têm sido enfrentadas pelos novos colaboradores, que foram contratados no atual momento. Não bastasse entrar em um ambiente conturbado, boa parte nunca sentou para interagir com colegas e liderança. O relato que tenho ouvido deles não é positivo: muitos se sentem isolados, desconectados e sofrem com a falta de confiança de seus pares. Integrá-los é um desafio que os líderes têm enfrentado.

Mas pode ser que as novas gerações, nascidas no mundo digital, tenham muito mais facilidade para se adaptar a esse novo mundo. Ainda não sabemos. Mas mesmo nessa nova configuração do trabalho, as empresas precisarão estar alicerçadas em valores sólidos e construtivos. E, seja no escritório ou no ambiente digital, a cultura de uma empresa depende das pessoas e da interação entre elas.

Por Rogério Said – vice-presidente de Pessoas, Gestão de Negócios e Cultura da Getnet, empresa de tecnologia do Grupo Santander especializada em soluções digitais de meios de pagamentos. 



Fonte: Mundo RH


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