Publicado por Redação em Notícias Gerais - 04/08/2016 às 11:52:45
A equipe de Temer sinaliza as primeiras investidas contra a CLT
A regulamentação das terceirizações figura entre as propostas a serem enviadas ao Congresso até o fim do ano
O governo do presidente interino Michel Temer pretende encaminhar ao Congresso Nacional três propostas de alteração na legislação trabalhista até o fim do ano: a regulamentação da terceirização, a conversão do Programa de Proteção ao Emprego (PPE) em política permanente, além de propor mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“A CLT será atualizada com o objetivo de simplificar, para que a interpretação seja a mesma para o trabalhador, o empregador e o juiz”, anunciou o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, na quarta-feira 20, durante um café da manhã com jornalistas.
No dia seguinte, durante um evento na sede do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano em São Paulo, no centro da capital paulista, ele buscou atenuar as naturais desconfianças: “O trabalhador não será traído pelo seu ministro do Trabalho”.
De acordo com Nogueira, a proposta de reforma trabalhista a ser elaborada pelo governo vai valorizar a negociação coletiva e tratar de assuntos como salário e jornada de trabalho, mas não vai permitir, por exemplo, o parcelamento de férias ou do décimo terceiro salário.
O governo pretende, ainda, perenizar o PPE. Atualmente, o programa tem prazo de adesão até o final de 2016, com término previsto para 2017. Ele permite que empresas reduzam a jornada de trabalho em até 30%, com diminuição proporcional do salário do empregado. A União compensa 50% dessa redução salarial, por meio do Fundo de Amparo ao Trabalhador, até o limite de 900 reais.
No caso da terceirização, Nogueira não entrou em detalhes. Antecipou que deve incorporar sugestões de diversas propostas em tramitação no Congresso, entre eles o projeto aprovado na Câmara em 2015, a liberar as subcontratações para quaisquer atividades.
Esquivou-se, porém, das indagações sobre a abrangência da proposta do governo. “Estamos falando em contrato de serviço especializado. Você tem de observar a cadeia produtiva e, dentro dessa cadeia, quais são os serviços que podem ser considerados como especializados e poderão ser objeto de um contrato. Nesse conceito você não entra na discussão do que é atividade-meio e do que é atividade-fim”.
Resistência do Movimento Sindical
Em entrevista a CartaCapital, Sérgio Nobre, secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), manifestou contrariedade às iniciativas anunciadas pelo ministro Nogueira, além de reforçar que as seis principais centrais do País – CUT, Força Sindical, UGT, NCST, CSB e CTB – devem realizar uma plenária nacional no próximo dia 26 de julho, para organizar a resistência às tentativas de reduzir direitos trabalhistas.
“Em primeiro lugar, um governo provisório, que não tem garantia da própria continuidade, nem deveria tocar nesses temas. Causa preocupação essa sanha em mexer na legislação trabalhista”, diz Nobre. “Não faço ideia do que vão mudar no PPE, isso não foi discutido com o movimento sindical. A Alemanha tem um programa desses criado há 50 anos, mas só usado em tempos de crise. Agora, sabe-se lá o que Temer pensa”.
De acordo com João Carlos Gonçalves, o Juruna, da Força Sindical, a conversão do PPE em política permanente pode ser positiva, desde que a adesão das empresas continue condicionada a um acordo com os trabalhadores impactados e com o sindicato local. Da mesma forma, considera as negociações coletivas uma conquista do trabalhador, desde que seja para ampliar direitos, jamais para suprimi-los ou reduzi-los.
“Durante a ditadura, eram os tribunais que determinavam os acordos e reajustes salariais. Após muita luta do movimento sindical conseguimos furar esse bloqueio no fim dos anos 1970, quando conquistamos o direito de negociar diretamente com os empregadores”, diz. “Hoje, acredito que as negociações podem ser valorizadas, mas não para suprimir os direitos básicos assegurados pela CLT. Isso jamais seria aceito pelas centrais”.
O movimento sindical tem razões para estar ressabiado. O momento de crise pode não ser propício para a adoção desse modelo, comum em países desenvolvidos. A valorização da negociação requer um fortalecimento dos sindicatos nos locais de trabalho.
A ameaça das terceirizações
Dos 48 milhões de trabalhadores formais do Brasil, estima-se que 25% atuem em empresas prestadoras de serviços subcontratadas por outras. Pela atual legislação, a terceirização só pode ser adotada para funções acessórias, como serviços de limpeza e vigilância, embora as fraudes abundem no mercado.
O PL 4330 poderia regular melhor a situação de ao menos 12 milhões de brasileiros que atuam nessa modalidade. Mas, após uma sessão comandada com mão de ferro pelo então presidente da Câmara, o peemedebista Eduardo Cunha, restou aprovado um texto que libera as terceirizações mesmo para as atividades-fim, e abre a porta para os outros 36 milhões serem convertidos em subcontratados.
Um dossiê preparado pela CUT, em parceria com técnicos do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), revela o tormentoso cenário das terceirizações no Brasil. Com dados de 2013, o estudo mostra que os terceirizados recebem salários 24,7% menores que os dos efetivos, permanecem no emprego pela metade do tempo, além de ter jornadas maiores.
“A terceirização indiscriminada gera, necessariamente, precarização dos contratos de trabalho”, alerta Ana Cláudia Rodrigues Monteiro, vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT). “Se não ficar restrita apenas aos serviços realmente especializados, que exigem conhecimento técnico, a terceirização se converte em mero instrumento de intermediação da mão-de-obra”.
De acordo com a procuradora, é perceptível, nos processos trabalhistas, que os terceirizados estão mais expostos a condições degradantes, que levam ao adoecimento físico e psíquico, além de ter maior propensão a acidentes laborais e calotes trabalhistas. “Por vezes, as empresas terceirizadas são de fachada, criadas para suprir a demanda de mão-de-obra de uma firma específica. Quando o contrato termina, a empresa fecha as portas e nem sempre cumpre as suas obrigações trabalhistas”.
Juruna, da Força Sindical, assegura que as centrais não vão aceitar propostas que liberem a terceirização para as chamadas atividades-fim. “Precisamos, sim, regulamentar melhor a situação dos trabalhadores que já operam nesse regime, mas não abrir a porteira. Até porque há o risco de perda de direitos e de achatamento dos salários nessa transição”.
Na avaliação da procuradora Monteiro, as crises não são totalmente imprevisíveis no sistema capitalista, por isso não deveriam servir de justificativa para reduzir direitos. “Uma hora a economia volta a crescer, mas as mudanças na legislação trabalhista vão continuar”.
Fonte: Carta Capital